As plantas não querem ser comidas

por Hugo Dunkel

Compreender as defesas das plantas: da sobrevivência à alimentação consciente, uma jornada agroecológica e regenerativa.

Ao contrário dos animais, as plantas não podem fugir dos seus predadores. Como tal, elas desenvolveram estratégias várias para se defenderem e sobreviverem: defesa física – munindo-se de elementos protectores como espinhos ou defesa por simbiose com animais defensores ao criarem condições benéficas para os atrair e que por sua vez as defendem – defesa visual – ao enganarem os predadores pela sua forma e cor – e entre outras, a defesa química.

As plantas desenvolvem os seus próprios pesticidas para se defender de herbívoros, bactérias e fungos. Esta defesa acontece de várias formas: destruindo o metabolismo ou a estrutura física do predador, alterando o seu equilíbrio hormonal, reduzindo a sua capacidade de digestão, entre outras. Acontece que muitos destes compostos tóxicos têm também um impacto relevante na saúde humana através da alimentação, pelo que são chamados de antinutrientes.

A história da humanidade está repleta de casos históricos do impacto destas substâncias: Pelagra causada pela importação de milho por colonizadores europeus que desconheciam os métodos tradicionais de preparação do mesmo; a nixtamalização, uma intoxicação por cianeto devido ao consumo de mandioca não lavada e fermentada adequadamente; e mais recentemente o crescente número de casos de desequilíbrios hormonais em crianças, causadas pelo consumo excessivo de soja. Afinal todos nos lembramos daquela flatulência que precede uma bela feijoada.

Em tempo de escassez a humanidade aprendeu a sobreviver com estas toxinas criando formas de reduzir o impacto destas na nossa saúde. O acumular destes conhecimentos levam a crer que a forma mais eficiente de evitar antinutrientes é eliminar da nossa dieta plantas que nos causam problemas ou combinar várias estratégias de mitigação assegurando que seguimos um regime alimentar que nos mantenha saudáveis.

O que podemos fazer?
Fermentar é um método tradicional de recorrer à ação metabolizadora dos microrganismos e reduzir fitatos e lectinas dos cereais e leguminosas sobre a forma de panquecas, papas e pão de massa azeda. A soja, alimento tradicional do oriente, é consumido maioritariamente fermentada sobre a forma de tempeh, natto, miso, molho de soja e outros. Muitos vegetais podem ser fermentados sob forma de picles, chucrute, kimchi, reduzindo os seus antinutrientes e tornando-os alimentos mais nutritivos. O açúcar pode ser usado para estimular o desenvolvimento de bebidas deliciosas como a kombucha d’ Aquela Kombucha, metabolizando-se num vasto número de compostos benéficos.

Demolhar cereais, leguminosas e legumes em água durante a noite, ou por períodos mais prolongados, permite reduzir fitatos, inibidores de enzimas, lectinas, taninos, fitoestrógenos e oxalatos. A maior parte dos antinutrientes são hidrossolúveis, sendo que se dissolvem facilmente na água que deverá ser descartada – a prática do uso da água da demolha e cozedura para fazer arroz de feijão ou aquafaba é uma estratégia antagónica. A demolha, quando longa, envolve um processo de fermentação que pode ser estimulada com recurso a vinagre ou uma fonte de microorganismos.

Germinar sementes torna mais acessíveis os seus nutrientes e degrada até certo ponto fitatos e ligeiramente os inibidores de enzimas e lectinas.

Cozinhar a altas temperaturas, especialmente através de fervura, degrada, até certo ponto lectinas, taninos, inibidores de enzimas, fitoestrógenos e glucosinolatos. Os oxalatos também podem ser reduzidos através deste método. Já os fitatos são bastante resistentes à temperatura e não apresentam grande degradação sobre este processo. Em geral, quanto mais cozinhado, menos antinutrientes o alimento apresentará. É preciso ter cuidado com a panaceia das dietas cruas que ignoram o impacto dos antinutrientes e exacerbam o seu consumo deles sobre a forma de batidos de vegetais e papas cruas de cereais.

Eliminar ou Reduzir o consumo de: açúcar, cereais, leguminosas, oleaginosas, solanáceas, crucíferas, espinafres, acelgas e demais plantas apresentadas no quadro antinutrientes e fazer uma alimentação rica e equilibrada em alimentos densos em nutrientes.

Compostar cascas de vegetais como batata e batata doce, ramas de cenoura e de beterraba. Reduzir o desperdício é importante, porém não à custa da nossa saúde, o solo e os animais ficarão muito mais bem servidos.

Saudações regenerativas,

Hugo Dunkel

Cultura alimentar, Agroecologia, Agricultura Regenerativa, Permacultura e Fermentação.

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